O que é a Verossimilhança e como Aplicá-la à Escrita Ficcional
Uma história verossímil é a uma das principais preocupações do escritor, pois é assim que o leitor irá acreditar nos acontecimentos e se conectar com o enredo criado. Vamos analisar o que significa a presença da verossimilhança, qual suas funções e objetivos e fazer um estudo de casos em algumas obras da literatura e do cinema. Continue a leitura e tente aplicar esse princípio ao seu projeto ficcional.
O que é Verossimilhança?
O termo significa “similar ao que é verdadeiro”, ou seja, semelhante à realidade. Dar a ideia de realidade na lógica interna de uma história faz com que o leitor ou espectador se conecte de maneira muito mais fluída, seja ela a história mais fantástica já escrita.
Cada narrativa possui a sua realidade, a sua verdade. Com isso, todos os acontecimentos daquela obra devem condizer com o mundo criado.
Nas histórias, todo evento possui uma causa e uma consequência e todos os pontos apresentados devem estar conectados. Não podemos citar que o personagem principal tem aracnofobia e, depois de algumas páginas, dizer que ele tem uma tarântula de pet. Isso tornaria o personagem e toda a situação inverossímil.
Verossimilhança Interna
Não importa o quão absurda seja a sua trama – se levamos em conta a realidade em que vivemos -, com uma coerência interna entre o enredo, personagens, o mundo e o tempo criados, ali haverá a verossimilhança interna, ou seja, dentro daquela obra tudo se conecta, faz sentido e parece verdadeiro.
O autor cria uma realidade paralela, um mundo alternativo – e verídico no contexto inserido.
Verossimilhança Externa
Quando a obra se alinha, se assemelha com a nossa realidade (seja ela histórica ou atual), podemos dizer que ela possui verossimilhança externa. Os fatos podem ser comparados à vida real.
Claro que as obras com verossimilhança externa precisam conter também a verossimilhança interna, já que cada personagem possui suas particularidades que precisam ser afirmadas e todos os elementos devem conversar entre si.
Funções e Objetivos da Verossimilhança na Obra de Ficção
Quando todas as partes da obra ficcional (enredo, personagem, tempo, espaço e narrador) estão em harmonia, compondo uma história “verdadeira”, o leitor ou espectador terá a impressão de realidade, e esse é o objetivo da verossimilhança: fazer o texto real.
Com a impressão de realidade, é muito mais fácil se associar à obra, se ver representado, se identificar e uma catarse acontecer.
A Minha Obra é Verossímil?
Acredito que você já tenha se deparado com sites dizendo que você deve fazer uma grande pesquisa para escrever sua obra, mesmo sendo ela de ficção e mesmo você tendo criado aquele mundo. E eu direi o mesmo: pesquise. A melhor forma de tornar um universo ficcional verossímil é pesquisando sobre o que está escrevendo.
Depois de ter coletado todas as informações que achar necessárias sobre aquele tema, aquele universo, coloque-as num papel (ou documento), porque com certeza você vai ter que visitá-las durante o processo de escrita.
Certo, o enredo agora pode estar verossímil, mas os pequenos detalhes estão batendo? Analise o seu personagem, o perfil, se ele tem fobias, gostos peculiares. Caso tenha, anote, pois você não poderá se contradizer depois de algumas páginas.
A cada final de capítulo, releia-o analisando se a história está semelhante à realidade proposta (o mundo real ou o universo criado) e também se a coerência interna está bem construída.
A Verossimilhança na Literatura e no Cinema – Estudo de Casos
Saga Star Wars
Claramente os filmes da saga Star Wars acontecem num tempo futuro, não há especificamente um tempo real – ano 5000, por exemplo -, mas já sabemos que não acontecem nos dias atuais. A primeira imagem do filme, no espaço, com naves, já nos introduz neste tempo fictício, de modo que esperamos ver mais itens futuristas ao longo da história. Eles serão muito importantes para passar credibilidade durante o filme.
O lugar também já fica claro desde o início: o espaço sideral, ou seja, não estranhamos se os personagens estão em outro planeta que não a Terra. Não estranhamos ver um planeta com 5 luas, ou um sistema com mais de um sol.
Os personagens interagem com robôs? Tudo bem, de acordo com aquela realidade isso faz todo sentido. Pronto. A verossimilhança interna está criada. O mundo de Star Wars não parece mais falso aos olhos do espectador: ele aceita, acredita e consegue se conectar com aquela realidade paralela.
Senhor das Moscas – William Golding
Apesar do livro ser uma grande metáfora para a perda da inocência e a moralidade humana, um grupo de pré-adolescentes britânicos sozinhos em uma ilha após o naufrágio de uma embarcação parece algo difícil de se acreditar. Onde estão os adultos?
William Golding precisou buscar diversos elementos para que a história se tornasse plausível. A construção daquela sociedade brutal tinha que ser possível aos olhos do leitor. Os personagens falam de uma maneira infantilizada, mas os líderes começam a agir como adultos, seguem os passos do que os adultos fariam, mas, de certa forma, a sociedade – que parecia democrática – acaba se tornando ditatorial e violenta.
É aí que Golding consegue a verossimilhança: há uma semelhança com a formação de diversas sociedades modernas, histórias que aconteceram no mundo real. Garotos seguem exemplos, e esse é o exemplo que eles possuem. Ele consegue conquistar a atenção do leitor e também cumprir o objetivo da metáfora.
Harry Potter – JK Rowling
Os livros de Harry Potter utilizam uma mistura entre a verossimilhança externa e interna – um mix do mundo real e fantástico.
Muitas passagens acontecem nas ruas londrinas, com pessoas reais, que poderiam acontecer com qualquer um que estivesse em Londres: casa em um subúrbio de classe média, um passeio à estação de trem, uma visita a um cemitério. Assim, JK consegue passar que aquela história e aqueles personagens são reais; aquele garotinho de 11 anos é um menino londrino vivendo com os tios.
Porém, ela cria uma realidade paralela dentro dos livros: um mundo escondido no nosso mundo, o mundo bruxo. Ele possui seus próprios elementos, suas próprias leis e costumes. E, junto com o garotinho, nós vamos adentrando e começando a acreditar naquele novo mundo. A verossimilhança interna da obra está criada. Ali tudo é real.
O Homem que Copiava – dir. Jorge Furtado
Esse é um filme realista. Se passa no início dos anos 2000, o seu personagem principal é um gaúcho que trabalha como operador de fotocopiadora. Certo, tudo extremamente real, é o dia a dia. Ou seja, ele é muito semelhante à verdade, tem um alto nível de verossimilhança.
O desafio não está em fazer o espectador acreditar que aquele mundo é real, porque está claro que é o nosso universo. Aqui, a dificuldade é criar correlação entre os acontecimentos para que pareça verdadeira a ideia de copiar dinheiro, de roubar um carro forte e ganhar na loteria. O conjunto deve ser verdadeiro aos olhos do espectador.
Portanto, o filme, além de ter uma verossimilhança externa, não deixa pontos soltos em sua história para que essa verdade e a catarse se perca.
Neste post tratei especificamente da verossimilhança nos textos ficcionais e narrativos, porém é importante lembrar que ela deve estar presente em textos argumentativos e dissertações. Não adianta fazer uma conclusão com proposta de intervenção – como é pedido no ENEM, por exemplo – sem nenhuma verossimilhança externa, de modo que aquela ideia não poderia ser levada adiante, por ser irreal.
Agora chegou o momento para você analisar o seu projeto, capítulo por capítulo, cena por cena. Examinar se ele está verdadeiro e se o leitor se conectaria com sua história. Ficou com alguma dúvida; tem outra sugestão sobre como tornar os textos ficcionais mais verossímeis; tem um exemplo que acha legal ser discutido? Comenta aqui no post ou, caso esteja vendo num link de rede social, comenta por lá também. Vamos trocar figurinhas sobre essa parte tão importante no processo de criação.
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Todas as imagens deste post possuem #PraCegoVer com audiodescrição resumida em seus textos alternativos.
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