OPINIÃO

Voltei a acreditar em comédias românticas

Depois da desilusão com “Amor & Gelato” e “A Vida é Agora”, minhas esperanças em filmes contemporâneos de comédia romântica tinham ido por água abaixo e a literatura estava sendo meu único refúgio. Será que nenhum streaming (ou produtora) vai conseguir realizar uma comédia romântica que tenha tudo que o gênero pede: leveza, graça e inspiração? Para minha feliz surpresa e retorno à crença em comédias românticas, a Netflix lançou “Look Both Ways”, uma rom com com uma protagonista super inteligente, numa situação que atrapalha demais seus planos, tanto profissionais quanto amorosos, de forma leve, engraçada e inspiradora.

“Como seria se…” conta a história de Nat (que linda coincidência), que transa com seu melhor amigo e faz um teste de gravidez na noite de sua formatura e isso acarreta na divisão da linha do tempo: em uma realidade, o teste deu positivo e na outra, deu negativo. E o melhor de tudo é que nenhum multiverso (posso chamar assim?) é melhor que o outro. E essa não é a vida? Tem momentos que a grama do vizinho é mais verde e momentos que a nossa grama está tão verde que a gente quer jogar na cara do vizinho. A questão é como você vai viver cada uma dessas realidades.

O elenco escolhido para o filme é maravilhoso, todos encaixaram perfeitamente em seus papéis e a direção de atores também foi ótima, afinal, estavam gravando praticamente dois filmes ao mesmo tempo. E devo dar crédito à montagem também, já que a proposta poderia ter ficado muito confusa, mas o filme passa de forma fluída e divertida.

Depois de me deliciar com “Look Both Ways”, uma pulguinha surgiu atrás da minha orelha: “caramba, mas qual pode ser o problema dos últimos filmes de romance que eu vi?” Porque, do ponto de vista de premissa, todos são ótimos, inclusive amei ler “Amor & Gelato”. Então resolvi fazer uma pesquisa sobre a equipe técnica de cada um desses três filmes e a resposta apareceu muito rápido: roteiro. A direção também, mas a questão do roteiro é grave.

Em “A Vida é Agora” há uma equipe de roteiristas , o que é raro para filmes, normalmente roteiros de filmes são escritos por um ou dois profissionais, no máximo. Acredito que essa equipe, composta por dois homens e três mulheres, foi o calcanhar de Aquiles do filme. Se você assistir, vai notar, ele não conta o que promete contar (até rimou kkk). É como se eu estivesse conversando com você e falasse “vou te contar do dia que eu comprei pão” e começasse a contar sobre a competição de cozinha que assisti. E o problema principal: dar muito protagonismo ao personagem que é o interesse amoroso da história.

Em “Amor & Gelato” nós temos um roteiro de filme baseado. Como ele deixa claro que é baseado, já sabemos que não vai ser 100% fiel ao livro, mas ele acaba sendo uma história diferente, quase um plágio do livro. E, mais uma vez, temos um protagonismo masculino, de um dos interesses amorosos da personagem principal, mais forte do que a da própria protagonista da história. Aliás, o roteirista desse filme é um homem.

Não estou dizendo que não deveriam existir comédias românticas com protagonistas masculinos, inclusive gostaria de ver mais, nem vem à minha cabeça uma boa agora (talvez “500 dias com ela”, não sei), e mais comédias românticas LGBT também (alô fãs de “Com amor, Simon”)! Mas se você se propôs a uma comédia romântica com protagonismo feminino, DEIXE O PROTAGONISMO COM A PERSONAGEM PROTAGONISTA.

E notando essa diferença de roteiro, a questão ficou clara: o único filme cuja roteirista e diretora são mulheres é “Look Both Ways”. Consequentemente, o protagonismo permaneceu na personagem principal, Nat, e os personagens Gabe e Luke (seus interesses amorosos) são ótimos coadjuvantes e cumprem seus papéis de interesses amorosos. Não sabemos nada mais do que o necessário da vida deles, mas temos plena consciência do papel de cada um na vida de Nat.

Essa questão é difícil, parece militância exagerada, mas não é. A partir do momento que você tira o protagonismo de uma personagem feminina e o passa para o personagem que seria o par romântico dela, toda a identificação e narrativa se perde, originando o grande desastre que pode ser um filme com roteiro ruim.

Uma boa obra emociona, uma ótima obra inspira e depois de assistir “Look Both Ways” fiquei mais inspirada em escrever as minhas comédias românticas que tanto gosto de criar, sem confundir protagonismos e levando assuntos importantes de forma leve para minhas leitoras e leitores. “Como seria se…” está disponível na Netflix.

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