#pracegover audiodescrição resumida: foto de um terminal em tons de azul. No centro, retângulo branco com o escrito "terminal", não-lugar.
OPINIÃO

O Conforto de um Não-Lugar

Como vocês sabem, estou postando críticas de alguns curtas presentes na 31ª edição do Kinoforum. Esta, porém, será um pouco diferente, pois tratarei de um conceito específico ligado não apenas ao curta “Terminal”, mas também ao filme “O Terminal”, de 2004.

Assim que vi o nome e a sinopse do curta-metragem sueco “Terminal” na programação da mostra internacional do festival, me veio à mente o filme de 2004. Intencional? Não sei, mas aconteceu. Ambos tratam de personagens que ficam presos em um terminal de ônibus – por vontade própria. Tudo bem, pode ser que o personagem de Tom Hakns tenha tido um incentivo externo a ficar, mas ele permaneceu. E por que ambos os personagens fizeram isso?

Um terminal de ônibus, um aeroporto e até mesmo um McDonalds podem ser chamados de “não-lugar” e os personagens se sentem muito tranquilos estando em um desses.

O Não-Lugar

Para entender o conceito de “não-lugar” deve-se primeiro tomar o de “lugar”. Um lugar pode ser definido por seus espaços e usos, ou seja, o que se está fazendo ali. Então, o lugar é mutável e diversificado, possui o seu mistério e a sua surpresa, já o não-lugar não tem essa profundidade.

Estes não-lugares, segundo Marc Augé, não possuem identidade, é um local destituído de qualquer referência histórica ou cultural; lugares de passagem sem significado suficientes para serem chamados de lugar. São lugares idênticos, seja lá em que parte do mundo você estiver — já percebeu como todos os Starbucks, por exemplo, possuem a mesma identidade? As estações de metrô, os shoppings, etc.

Por conta dessa forma idêntica e facilmente reconhecível — não vamos entrar no mérito de branding neste post —, estes locais se tornam altamente aconchegantes e seguros. Imagine que você está em um país que você não conhece, não é fluente na língua natal, e você se perdeu, assustador, não é? Mas de repente você vê um McDonalds e você sabe que lá é um lugar seguro, que você conhece, e basta pedir o número 1 que chegará um Big Mc.

O Não-Lugar em “Terminal” e “O Terminal”

Tendo em vista o conceito de não-lugar, pode-se notar como tanto no curta-metragem quanto no longa, o lugar de passagem, que são os terminais de ônibus, tomam uma dimensão de personagem, afinal, são tão protagonistas quanto às pessoas.

Em “O Terminal”, dirigido por Steven Spielberg, Viktor se vê preso no terminal rodoviário por conta do fechamento das fronteiras. Mas ele se mantém ali, porque é o que ele conhece. As pessoas vêm e vão, a rotina do terminal continua, novas histórias, novos destinos, mas Viktor permanece.

Em “Terminal”, curta-metragem de Kim Allamand, uma senhora compra passagens todos os dias para esse lugar que almeja chegar, mas ela nunca realmente embarca no ônibus. Apesar disso, ela não vai embora dali, ela continua nos cafés, nos bancos de espera, como se aquele fosse o lugar que ela pertencesse e não o seu destino final.

Os Não-Lugares Como Sintoma da Perda da Individualidade

Tudo acontece a todo momento, em todo lugar. Com tanta infomormação bombardeada nos dias de hoje, é necessário autoconhecimento para pegar as referências de qualidade para uma vida psicologicamente saudável. A perda da singularidade – e o crescimento da massa – é um sintoma do excesso de signos na modernidade.

Para Marc Augé, o indivíduo moderno é o resultado de um “excesso de referências, que lhe chegam pela vivência urbana, pela comunicação, que o leva, igualmente, a reelaborar sucessivamente todo excesso de informação que lhe chega e experiências que usufrui”.

Indico que assistam aos filmes para terem uma visão mais acertiva sobre o conceito e sobre a sociedade contemporânea.

Lembrando que o curta-metragem “Terminal” estará disponível para visualização no dia 27 de agosto a partir das 19h no site do Kinoforum. Para mais críticas dos curtas do Kinoforum, basta acessar o post inicial sobre o festival.

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